As árvores estão quase despidas e tu não chegaste a saber como gosto de vê-las douradas. Não chegaste a saber que a caminho dos 30 anos ainda salto nos montes de folhas secas só para ouvi-las estalar debaixo dos meus pés. Era esta a altura para aprenderes que o meu chá preferido é o de maçã e canela feito em casa e que o bebo sempre sem açúcar, ou então o de hortelã com uma colher de açúcar amarelo. Que os meus biscoitos preferidos são os de gengibre e canela e que o meu chocolate preferido tem avelãs. Tu não sabes, porque não ficaste o suficiente para aprender, que o barulho e o cheiro da chuva são os meus preferidos e que digo sempre que o outono é a minha estação mas a verdade é que nunca consegui escolher uma porque sou indecisa demais. Tu não sabes que, mesmo assim, eu escolhi-te a ti, cedo demais. Tu não aprendeste que, quando acordo, nunca fico na cama muito tempo porque começo a pensar demais e não sabes, porque não ficaste tempo suficiente para aprender, que o meu pequeno almoço preferido vai ser sempre leite e torradas com muita manteiga. Não sabes que o meu doce preferido é o de abóbora nem que nunca vou deixar de pintar as unhas de vermelho, nem de cantar no carro embora saiba como canto mal. Tu não sabes, porque não quiseste saber, como me apaixonei por ti e como te dei o que de melhor tinha. E não sabes como foi ter de guardar de volta todos os beijos que não quiseste no bolso, e seguir. Tu não chegaste a saber, mas eu ter-te-ia dado todas as canções, todos os poemas, todas as juras que precisasses de ouvir e também a minha mão. Mas tu não ficaste tempo suficiente, e por isso não aprendeste que o pôr-do-sol será sempre a minha altura preferida do dia, nem que nada me acalma como ver o mar ou olhar as estrelas, nem como seria se não me tivesses arrancado tudo das mãos.
terça-feira, 28 de maio de 2013
quarta-feira, 22 de maio de 2013
Ter o coração partido é ter de parar.
Ter o coração partido é ter de parar. Ter de parar de sentir
saudades, de sentir, de querer. Ter de parar de esperar. Que ele volte, que se
arrependa, que o telemóvel toque e seja ele. Que chegue num cavalo branco com a
capa que nunca lhe serviu. Ter o coração partido é ter de parar de pensar no
que fizemos de errado, no que podíamos ter feito diferente. Ter de parar de
imaginar que pode haver outra pessoa no nosso lugar a fazê-lo feliz. É ter de
parar de pensar que devíamos ser nós a fazê-lo feliz. Ter de parar de ter
noites em branco ou cheias de sonhos com ele, ter de parar de lembrar tudo, ter
de parar de saber a que soava o riso dele. Ter o coração partido é ter de parar
de ter medo que a próxima pessoa também nos desfaça. É ter de parar de chorar antes
de adormecer. Ter de parar de vê-lo em todo o lado. De lembrar as conversas que
tivemos e de imaginar as que podíamos ter tido, de pensar em tudo o que
podíamos ter sido, de achar que demos demais. De querer voltar atrás e ter só
mais um dia com ele. Ter de parar de ter os dias cheios de saudade. Ter o
coração partido é ter de parar. É ter de parar, mas nunca, nunca conseguir.
sábado, 11 de maio de 2013
Eventualmente, cansa.
Eventualmente cansa. Não ter aquela pessoa que nos conhece
como ninguém, que sabe que quando estamos tristes precisamos de uma tablete de
chocolate com amêndoas, que sabe que não deve fazer-nos perguntas de manhã
porque vamos sempre responder mal, que sabe que o nosso sítio preferido é ao pé
do mar a ver o pôr-do-sol. Cansa nunca ouvirmos as palavras que queríamos
ouvir, aquelas de que precisávamos mais. Nem que fosse no final dum desses dias
merdosos. Cansa não haver quem se despeça de nós sempre com um beijo antes de ir
para o trabalho, mesmo sabendo que odiamos que nos acordem – cansa não ter quem
saiba que preferimos que nos acordem só para termos esse beijo na testa, ou
então não ter quem se arrisque a dá-lo, porque não quis ir embora sem se
despedir de nós, mesmo sabendo que pode levar um empurrão por nos ter acordado.
Eventualmente, cansa. Não ter quem pense em nós logo de manhã e faça questão de
nos dizer isso, ou então quem pense em nós antes de adormecer e também faça
questão de dizer isso. Cansa não ter quem sinta a nossa falta e o diga de vez
em quando, cansa não ter quem nos diga que somos importantes e não ter quem
enumere todas as razões pelas quais se apaixonou por nós. Cansa não ter quem
nos diga que o apaixonámos, assim, de forma parva, tão parva como a que
sentimos. Cansa não saber que somos tão queridos quanto queremos, não saber que
sonham com o nosso sorriso ou com os nossos olhos, não ter quem nos ligue só
porque precisava de ouvir a nossa voz. Cansa não saber se a nossa voz faz falta
a alguém. Cansa, eventualmente cansa. Não ouvir que foi tão bom estar connosco
que não apetecia ir embora, que os minutos até chegarmos foram contados com
ansiedade, que a música na rádio ao fim da tarde fez pensar em nós e sorrir.
Não ter quem queira uma fotografia nossa só para poder ver-nos quando não
estamos, não ter quem nos queira tanto na sua vida que nos apresenta a todos os
amigos, não saber se alguma vez fomos ou seremos aquilo que gostávamos de ser.
Cansa, sobretudo, que os gestos não se coordenem com as palavras, e não saber o
significado das ausências. Eventualmente, cansa. E, sobretudo, cansa não saber.
quinta-feira, 2 de maio de 2013
Ter o coração partido é não saber.
No fundo, ter o coração partido é não saber. Não saber como
passar pelos dias agora que ele não está. Não saber como apagar as mensagens,
nem como não sabê-las de cor. Não saber como não lembrar a voz dele nem as
palavras que disse. Ou as que nunca chegou a dizer. Ter o coração partido é não
saber sequer se a culpa foi dele por ter mentido ou nossa por termos
acreditado. Não saber se ele ainda usa o mesmo casaco, se ainda se penteia da
mesma forma, se ainda cheira ao mesmo perfume. Não saber se ele agora dá a mão
a outra pessoa, se outra pessoa encosta a cabeça naquela que era a nossa
almofada e adormece no abraço apertado dele. É não saber se há alguém que ele
faça rir como nos fazia rir a nós. Ter o coração partido é não saber quando
vamos ter sossego no coração outra vez, e não acreditar que um dia vai voltar a
ficar tudo bem. É não saber se ele ainda pensa em nós, se tem saudades, se se
arrepende. Se acha que devia ter-nos dado outro valor. E desejar que sim. No
fundo, ter o coração partido é não saber se algum dia vamos voltar a tê-lo
inteiro.
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